Como era esperado, o tema de debates na última sessão ordinária de fevereiro foi o Projeto de Lei 002/2025 do Poder Executivo que cria um sistema de gastos de dinheiro público de forma “imediata”. A justificativa é, como o próprio prefeito disse, “se precisar comprar uma água para servir para o contribuinte, vai esperar a autorização do secretário de finanças”?
O próprio exemplo dado pelo autor da lei é a evidência da banalização dos gastos. O Artigo 3º da lei define a contratação de uma operadora de cartões para inserir estes valores que ficarão à disposição do secretário municipal de cada pasta. É o cartão corporativo nos moldes do que é usado no Governo Federal.
A explicação do próprio prefeito é que gastos pequenos e emergenciais podem ser resolvidos ali, na hora, com um cartão de débito ou de crédito, com um valor delimitado para cada Secretaria. No entanto, se não houver planejamento, tudo vira improviso e emergência.
Pegando o exemplo de Márcio Corrêa em entrevista à Rádio 105,7FM, o de “comprar uma água”. Para evitar que haja falta de insumos básicos como a “água” ou papel higiênico ou uma resma de papel para a impressora basta que se faça o planejamento de uma compra programada, através de uma licitação. Aliás, é para evitar cenários como o da “água” que esta “água” não seja superfaturada é que existe a Lei 14.133/2021, conhecida como “Lei das Licitações”.
Mas este, que já não é pequeno, não é o único problema deste projeto de lei que, na sessão de quarta-feira, foi defendido sob uma intensa chuva de argumentos delirantes (e mentirosos) como, até mesmo, dizer que o “servidor merece confiança de portar o cartão”, como se:
- o cartão ficasse à mão de qualquer um
- A prerrogativa de honestidade valesse alguma coisa.
Afinal, se esta fosse a regra não precisaria de Controladoria Interna, leis de licitação e escândalos de desvios de verbas.
Pura ladainha.
O que falta à Lei da Gastança explicar é:
- Haverá um perfil definido de tipo de gasto ou consumo? Por exemplo, o cartão de gastos expressos e emergenciais para a Secretaria de Esportes pode compreender a aquisição de bolas de futebol, vôlei, basquete. Mas isso seria permitido, por exemplo para a Secretaria de Comunicação?
A falta de uma delimitação de perfil de contratação de serviço e gastos, além do teto financeiro, abre uma larga avenida em que tudo pode ser comprado ou contratado, sob qualquer justificativa.
- Antes de realizar a compra por meio do cartão corporativo, o responsável legal, no caso o secretário municipal, deverá fazer consulta de preço? Se precisar, por exemplo, de uma resma de papel (que deveria ter numa compra via licitação no almoxarifado, mas ok) ele poderá entrar na primeira papelaria que achar, ou a que ele tem um “conhecido”, ou terá registrar uma pesquisa prévia pelo menor preço?
No Portal da Transparência do Governo Federal, o uso do Cartão Corporativo (lá, denominado do eufemismo de “Cartão de Pagamentos”), há um sistema online de publicação dos gastos, com a identificação dos nomes dos responsáveis pela compra, dos locais onde algo foi comprado, do que foi adquirido e, sobretudo, quanto custou aquele procedimento. Só que na lei de Márcio Corrêa não há NENHUMA previsão legal sobre prestação de contas ou da disponibilização deste controle por parte de qualquer cidadão.
Para usar o exemplo do prefeito, o de “comprar uma água”, nada impede que seja, no lugar da “água para servir para o contribuinte”, seja adquirida uma garrafa de champanhe ou uísque para “ir amolecendo o contribuinte”, sem que ninguém fique sabendo nem o que foi comprado, nem onde e muito menos quanto custou.